Dom Casmurro
Publicado pela primeira vez no último ano do século XIX, Dom Casmurro é uma ilustração sob medida para o famoso verso de Fernando Pessoa, em “Mensagem”: “o mito é o nada que é tudo”. Entre outros sentidos possíveis, esses versos enigmáticos referem-se ao fato de que o mito inicia-se com uma ficção — um nada — que, no entanto, acaba por tornar real aquilo de que fala. Como os mitos procuram assimilar aquilo que, num dado momento, não faz sentido ou nos parece inexplicável — a origem do mundo, o nascimento do primeiro homem, o que existe depois da vida — já contam com a nossa simpatia, o nosso desejo de entender. E como são hábeis em inventar possibilidades, hipóteses que parecem muito plausíveis para as comunidades que os criam, fincam raízes em nosso imaginário.
É exatamente esse o movimento do livro de Machado de Assis. O enredo do romance é um nada: a história de um adultério, como milhares de outros. Mas, para quem ama, a traição é dolorosamente inexplicável; e além disso, nenhum adultério é igual ao outro. É isso que Bentinho parece nos dizer com insistência, nas entrelinhas de sua narrativa; e é aí, muito provavelmente, que está toda a sua astúcia de contador de histórias e, portanto, de criador de realidades possíveis.
fonte: www.educarede.org.br
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